Empreender em casal: dá certo?

Está aí um tema em que eu ¨paguei a língua¨. E vou explicar por quê.

Talvez para algumas pessoas a realidade de trabalhar ao lado do namorado, parceiro ou marido seja completamente natural. Mas até poucos anos atrás, isso era algo que eu via com muito receio. Mas muito mesmo.

Eu só pensava nas questões negativas que pudessem envolver esse tema: como fica a imparcialidade profissional se você é chefe do seu parceiro (ou vice-versa)? O quanto uma relação pessoal pode interferir na dinâmica da empresa? E os conflitos que todo casal tem, como não levar para o ambiente de trabalho?

Só que a vida é irônica, meus amigos. E mesmo com todas essas perguntas…

Você acaba casando com o coleguinha de trabalho.

Exatamente por esses receios, eu relutei bastante quando conheci meu marido justamente na organização onde nós trabalhávamos. Não só isso: na época nossas mesas ficavam uma do lado da outra, os jobs eram os mesmos, criávamos juntos. Não foram poucas as vezes em que eu pensei: ¨Se o namoro acabar, imagina a torta de climão que vai ficar nesse setor?¨.

Mas não acabou. Deu tão certo que virou noivado, casamento e, há poucos meses atrás, decidimos abrir nossa própria produtora, a Oneness. E agora vem a parte de como ¨paguei minha língua¨: preciso dizer que, sim, acredito que a parceria profissional entre casais funciona. Mais que isso: acredito que ela pode ser fantástica!

Mas afinal, o que faz e não faz uma parceria entre casais funcionar? Vou compartilhar aqui 5 pontos que têm sido decisivos na nossa história de empreendedorismo. E espero que isso possa colaborar de algum modo com a sua história.

1. Diferenças agregam valor ao negócio (quando bem administradas) 

Esse é um ponto importante de se mencionar, já que as diferenças podem realmente fazer a gente se questionar se vale a pena empreender com o parceiro. Eu e Katsuyo, co-fundador da empresa e meu marido, sempre fomos muito diferentes em habilidades, temperamento e atitudes, mas, desde o começo, surpreendentemente complementares.

Como alguns que nos acompanham já sabem, eu sou roteirista e responsável por nosso conteúdo, pré-produção e produção; ele é filmmaker e gerencia nossa pós-produção; eu sou mais extrovertida, realista, planejadora; ele é mais tímido, otimista, flexível. Acredito que essa fusão e esse equilíbrio foram, desde o começo, as razões pelas quais nós gostávamos tanto de trabalhar em dupla.

Vimos que éramos mais fortes juntos e passamos inclusive a receber mais feedbacks positivos do que antes. Em termos de negócio, agregamos valor percebido a nossas produções; em termos de relacionamento, foi um aprendizado excelente. Dar voz e razão a quem é diferente de você pode não só trazer uma outra perspectiva da situação, como pode te fazer enxergar (e impedir) muitos erros.

2. É preciso ir em direção ao mesmo alvo

Diferenças são positivas, mas acredito que para o negócio dar certo, o casal precisa ¨ser igual¨ em algo que é essencial: o objetivo. Não importa se é tornar a empresa reconhecida internacionalmente ou vender a arte de vocês na praia: seja qual for o objetivo, o importante é que estejam em acordo quanto a isso e sonhem juntos.

Qual é o core business de vocês? Onde vocês querem estar nos próximos 5 ou 10 anos? Onde querem que o negócio de vocês esteja? Essas são perguntas que renderam horas de conversa por aqui – mas que trouxeram muita paz e clareza quanto ao que sonhávamos para o nosso futuro pessoal e profissional.

3. Cuidem do cliente tanto quanto de vocês

Provavelmente a rotina vai ser intensa, já que vocês moram e trabalham juntos. No caso do nosso nicho profissional, o audiovisual, essa intensidade tende a ser ainda maior por causa das particularidades da área, mesmo: perdemos a conta de quantas vezes passamos a madrugada produzindo um filme ou ficamos dias seguidos fazendo as refeições na ilha de edição. Na maioria das vezes nossa rotina não segue a jornada regular de trabalho e descanso, e isso, somado ao fato de que somos responsáveis pelo negócio e temos uma série de outras questões para gerenciar juntos, aumenta nosso desgaste e proporciona mais possibilidades de ¨treta¨.

Por isso, pode parecer clichêzão, mas é verdade: é essencial cuidar da relação de vocês, até porquê, se a relação não vai bem, o negócio também não irá. Sejam transparentes, ¨estudem¨ sobre relacionamento (costumamos estudar sobre tudo na vida, menos isso), ouçam casais mais experientes (tanto onde erraram como onde acertaram), sejam firmes em ter um tempo só para vocês e saibam estabelecer, na medida do possível, o limite entre o trabalho e a relação.

Digo ¨na medida do possível¨ porque nem sempre dá para desconectar – vocês vão acabar falando do compromisso X na hora de dormir ou recebendo uma mensagem de algum cliente no meio do jantar de aniversário de casamento. Algo simples que nos ajudou bastante nisso é tentar manter as conversas com os clientes pelos canais corporativos (whatsapp, telefone, e-mail) ao invés dos canais pessoais. Claro que nem todos os assuntos podem ser tratados desse modo, mas é surpreendente como isso ajuda a preservar os momentos de descanso de vocês.

4. Casais ¨tretam¨ mais?

Uma coisa que aprendi é: é quase impossível não haver desentendimento com seu parceiro se você trabalha diretamente com ele. E isso por uma simples razão: você provavelmente já se desentendeu com qualquer outro colega de trabalho, independente de ter uma ligação romântica com ele. Pessoas são pessoas e o trabalho proporciona isso: discórdias, imprevistos, estresses diários, testes de paciência.

A diferença é que quando há um grau de intimidade maior, existe a possibilidade de os conflitos serem um pouco mais frequentes – seja por algum estresse pessoal que acaba se refletindo no trabalho, seja porque a gente tende a ser mais transparente com quem temos mais liberdade.

As palavrinhas-chave são: profissionalismo e bom senso. Se algum conflito aconteceu entre vocês em casa antes de uma reunião ou no dia de entrega de algum job, é preciso respirar e virar a chave. De preferência, se possível, resolvam o conflito antes de continuar o trabalho. E acredite: sim, é possível.

5. Organização e planejamento

Esse último ponto é essencial para qualquer empreendedor, mas penso que faz toda a diferença para os casais. Isso porque a rotina e a convivência tendem a fluir melhor quando as pessoas sabem o quê, como, quando e porquê fazer (ou, o lead do negócio).

Quando o casal estrutura sua empresa no diálogo, tem clareza das suas próprias atribuições e funções, possui metas e objetivos definidos e se planeja tanto em relação aos compromissos diários como ao futuro do negócio, tudo muda de figura. Isso vale também para a vida pessoal: é impressionante como a organização e o planejamento podem potencializar suas habilidades, evitar desgastes e trazer paz para o casamento.

Concluindo e reforçando: quando mencionei no início do texto que ¨paguei minha língua¨ em relação a casais empreenderem juntos, é realmente verdade. Preciso dizer que não canso de me surpreender com o profissionalismo, a força, o potencial e a versatilidade que nós, casais empreendedores, ou casais que trabalham juntos de alguma forma, temos. Talvez nossos desafios sejam maiores? Talvez. Mas talvez algumas vantagens também sejam.

O objetivo deste artigo não era o de oferecer um tutorial, e sim o de oferecer uma perspectiva encorajadora e livre de preconceitos (preconceitos estes que eu já tive um dia). É entusiasmante ver o número cada vez maior de casais que tem unido talentos, lutado por objetivos em comum e contribuído com suas expertises para a melhoria da nossa sociedade.

Se vocês são ou estão prestes a ser um deles, continuem. Garanto que vai valer a pena.

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